sexta-feira, 19 de setembro de 2008

PF apela à psicologia para algemar


A Polícia Federal recorreu à psicologia para defender o direito ao uso de algemas, prática limitada por súmula do Supremo Tribunal Federal (STF) de agosto.

Um parecer das psicólogas Miriam Regina Braga e Mariana Neffa Araújo Lage, da Academia Nacional de Polícia, adverte sobre "a impossível missão imposta ao policial" de avaliar em que situação elas devem ou não ser usadas.

As duas argumentam que as pessoas são imprevisíveis em momentos de estresse, como na hora de uma prisão. Com citações a diversos estudos, concluem que "uma padronização de procedimento é a opção mais adequada, tornando o ato de algemar em todas as situações a mais segura para todos envolvidos".

O parecer foi pedido pelo Setor de Ensino Operacional da Academia Nacional de Polícia do Departamento de Polícia Federal.

O trabalho é contestado. Talvane de Moraes, psiquiatra há 45 anos, que lida com a psiquiatria forense no Rio, acha que as duas generalizaram uma situação para defenderem uma tese "consentânea com o local onde trabalham".

Em São Paulo, o também psiquiatra forense Guido Palomba, presidente da Academia Paulista de Medicina, considera "que elas forçaram um pouco a barra dizendo que todo quadro de estresse leva a comportamentos imprevisíveis".

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.



Resposta do CFP à notícia intitulada "PF apela à psicologia para algemar"

Falando Sério: Nenhuma forma de Violência vale a pena

Em matéria intitulada “PF apela à psicologia para algemar” publicada no jornal O Estado de São Paulo de 14 de setembro último, lemos o depoimento de duas psicólogas, pertencentes aos quadros da Polícia Federal, onde afirmam ser justificado o ato de algemar, indiscriminadamente, cidadãos que recebem voz de prisão por agentes da PF. Em que pese o lugar de onde opinam as profissionais- elas próprias parte da corporação policial em pauta- suas idéias e concepções não coincidem com os princípios que orientam hoje o debate da psicologia brasileira em torno do tema da justiça, segurança pública e defesa dos direitos humanos. O Sistema Conselhos de Psicologia ( Conselho Federal e Conselhos Regionais) estão próximos de realizar o II seminário sobre o sistema prisional brasileiro e o papel dos psicólogos. Na pauta ! desse seminário apontamos claramente para a tarefa urgente de tratarmos as políticas criminal, penitenciária e de segurança pública brasileiras como caso de calamidade pública merecendo a preocupação de toda a sociedade. Em nossos cárceres imundos mantemos cerca de meio milhão de seres humanos, preponderantemente jovens e miseráveis, muitos deles sem sentença condenatória e passando por todo tipo de violação de direitos. A violência do Estado, muitas vezes legitimada pela mídia, torna-se recurso natural nas ações de repressão aos atos infracionais.

Ora, algemar sob o argumento de que o estresse torna os sujeitos humanos imprevisíveis é generalizar os fenômenos psicológicos, banalizando sua complexidade. Isso pode acabar por justificar a transformação de uma ação de prevenção em ato de ostentação de força e violência onde o sujeito abordado pode tornar-se vítima de humilhação social. Esse efetivamente não deve ser o papel da PF que tem demonstrado seriedade e cautela nas operações que todos acompanhamos nos últimos tempos. O uso da violência desqualifica sua conduta profissional, perdendo credibilidade social e o respeito dos cidadãos que acreditam nos princípios democráticos.
O Conselho Federal de Psicologia, em sintonia com a campanha das Comissões de Direitos Humanos do Sistema Conselhos de Psicologia, acredita que NENHUMA FORMA DE VIOLÊNCIA VALE A PENA.

Humberto Verona
Presidente do CFP